Você já deu bom dia ao seu vizinho? Ao menos sabe quem ele é? Não digo tão somente o vizinho de apartamento, da casa, do trabalho, da chácara ou da fazenda. Não. Refiro-me também aquela pessoa que você vê todos os dias, na fila da padaria, na caminhada, na academia ou por quaisquer vias que trafegue.
O vizinho é na verdade o ser humano que está ao seu lado. Em várias situações que se repetem ao longo de sua vida. Essa perda de sensibilidade que grassa no dia-a-dia se reflete em nossas posturas. Ao ignorarmos o pedinte que está com frio ou fome. Ou não fazermos uma visita, ou mesmo entrarmos em contato ( e hoje são tantos os meios ! ) com quem sabidamente está doente ou sofre.
Um grande amigo que empobreceu rapidamente – nas palavras dele, quebrei – reclama que não é chamado para festas, que não se lembram mais de seu aniversário e que até algumas pessoas viram o rosto quando o veem, evitando o cruzar do olhar. Diz ele que quando rico, todos são amigos de comemorações e alegrias. Agora pobre só restou da família aqueles que não dependiam dele. E dos amigos, somente os mais velhos, o que da essência dos tempos escolares não foram maculados os contatos, lembranças e carinho.
A atraente mulher que ganhava olhares e assovios – nos tempos em que assédio era algo dúbio – com o ganho de peso, a idade e demais complementos que destroem a dupla do mito feminino de eterna juventude e beleza, agora é solenemente ignorada. Não adiantam perfumes ou joias. Dentro dela eu garanto que ainda vive em esplendor. Mas praticamente ninguém quer ouvi-la.
Aliás, que arte tão nobre está se perdendo pelos modernismos vãos: ouvir. Quantas vezes nessa semana você realmente parou para escutar alguém? E não precisa ser absolutamente em caráter profissional. Ao contrário. O viés humano é bem vindo nas ruas, fora do seu círculo de amizades e contatos. Aquela escuta profunda, interessada. Tão bonito e tão incomum…
Enquanto os avanços tecnológicos são tão grandes que até temos agora uma inteligência artificial para conversar e tirar nossas dúvidas, onde está a suavidade da interlocução? Do bate-papo? Das tarde a fora e noite adentro, sem bebidas ou drogas, mas com a boa conversa. Os risos. A piada. Os grandes relatos das pequenas coisas.
Antes que alguém venha me dizer que sou ou estou saudosista, discordo. A unicidade humana está no grupo. No sentido de pertencimento. Vive mais aquele que tem laços profundos, que se sente útil, que participa de alguma comunidade. Podemos aumentar nossa longevidade com os ganhos técnicos da Medicina e isso é bom. Mas a qualidade de vida é sempre será: bom sono, boa comida, atividade física e mental, conforto básico de roupa e moradia. Não adianta correr ou acumular bens e ativos se você não tiver simplesmente alguém com quem conversar… no ocaso dos dias.
Da próxima vez que alguém lhe procurar para o agradável “jogar conversa fora”, não invente desculpas. Pois dentro desse encontro estarão embutidos segredos e intimidades. Desafios e escolhas. E muitas vezes pode ser você que esteja precisando desse tempo. Dessa atenção. Não criemos cascas grossas de defesas pessoais. Mesmo o besouro em sua desajeitada carapaça, voa. Voar é melhor que sofrer e conversar é uma coisa boa.
JB Alencastro, especial para o D9 Notícias