Estou triste, muito triste. E também deveras impressionado. Esse acidente causou uma forte reação em mim.
Pois estou vivendo uma aventura fora da bolha há 3 anos, com minha esposa. E estamos imensamente felizes com isso. Já escalei o Kilimanjaro, na África, o Elbrus na Rússia, o Aconcágua na Argentina, o Huayna Potosi na Bolívia.
O Cotopaxi, o Cayambe, o Imbaburra e o Fuya Fuya, todos esses quatro no Ecuador. Monte Roraima na Venezuela… sabe o que mais me assusta? O sem número de “especialistas” que surgem com teorias e principalmente julgamentos acerca desse trágico acontecimento. Sinceramente, não tive coragem de opinar sobre isso tudo. Só li, ouvi e vi.
E muito aprendi, ainda mais, sobre o ser humano. Ah, já estive em Bali, na Indonésia, em frente tem a ilha de Nusa Penida e depois a ilha de Lombock que sobrevoei – vi o vulcão de cima, lindo – quando fui passar 4 dias mergulhando no Arquipélago de Komodo.
Ano que vem nós quatro (pai, mãe, filho e filha) estaremos lá juntos, em Ubud, Bali, Indonésia.Primeiro ponto é que jamais devemos transformar uma vítima em réu. Jovem, bonita, cheia de energia, viajando.
Que mal ela fez a alguém? Obviamente que nem toda experiência vale o risco. Mas será que nós sabemos o risco que corremos em tudo que fazemos? E por acaso avaliamos bem, isso? E mais, somos informados da verdade de que o fabuloso, o incrível, pode ser fatal?Em todas as montanhas que escalei, nunca estive só.
Em momento algum. Regra de ouro. O grupo era sempre coeso, forte, unido. Se um não deu conta, o outro ajuda, como o Montoro no Kilimanjaro que apoiado em mim, chegou ao cume. É um absurdo a solidão na montanha.
Fria. Sem visão. No Elbrus, o Mark e meu filho estavam cansados demais. Pedimos mais um dia de descanso, antes do ataque ao cume. Na primeira ida ao Cayambe o Dídimo passou frio e o vento, e as pedrinhas queimaram seu rosto sem proteção, retornamos.
Treinamos muito, mas o respeito aos limites individuais é fundamental. Arriscar sem preparo é grave. Sem alimentar-se, sem descanso. Isso vale para quaisquer atividades físicas, sejam de aventura ou não. Se você está exausto e vai de bicicleta comprar pão na esquina, pode desequilibrar e ser atropelado.
Qualquer um pode ocorrer isso. Se você é o guia, ou se temos um guia, ele não é o primeirão, o da frente. Vida e montanha não é competição, é desfrutar, é se deleitar. O líder é quem apoia, evita o mal maior, quem está o tempo todo ao seu lado e vigiando os demais.
Essas pessoas devem ter experiência, treinamento específico e habilidade para conduzir e principalmente resgatar aqueles que o infortúnio atinja. Olha, se você não está subindo encordado (um amarrado no outro), a visibilidade é fundamental. Lanternas de cabeça, comunicação verbal constante.
Contato via rádio com a base. Faltou um? Procura, grita, volta. Vai atrás. Deixar uma pessoa cheia de problemas para trás é covardia. Vivemos numa sociedade egoísta, consumista, imediatista e narcísica.
Precisamos nos unir. E não criticar sem justa causa. E por fim o tempo pode ser fatal. A ajuda, o auxílio, o socorro, ou pelo menos a manutenção do mínimo de bem-estar na vivência do perigo é primordial.
Como em um mergulho por apnéia, cada segundo conta, antes de você simplesmente, apagar. Atrasos injustificáveis, ausência de estrutura básica, pouca explanação do que realmente vai encontrar, ceifam vidas. Bruno, disparado, o mais forte de nós, teve que ser resgatado de helicóptero do Aconcágua.
Acontece, mas tem que ter recurso.Olha moça, onde você estiver, fica minha oração para a paz de sua alma e de seus familiares. O exemplo de enquanto viva ser autêntica e alegre, ficam. E as lições de que o mundo inteiro ao nosso redor pode, e deve esclarecer, e ajudar a quem se entrega a vida de maneira ampla. Esse mundo é que é o verdadeiro responsável. Ou seja: todos nós.
JB Alencastro
Especial para para o D9 Notícias.